13.5.10

Lula: o bom, o mau e o feio

Por Moisés Naím - publicado originalmente no jornal El Pais (09/05/10)

A revista Time acaba de incluir Luiz Inácio Lula da Silva entre as pessoas mais influentes do planeta. Certamente, as atuações do presidente do Brasil têm afetado a vida de milhões de pessoas e, no caso de seus conterrâneos, de forma muito positiva. Mas Lula não só merece o aplauso e admiração. Há também aspectos de seu comportamento que são vergonhosos. Vamos ver.

- O bom. Dez milhões de brasileiros passaram a integrar a classe média entre 2004 e 2008. A pobreza caiu de 46% da população em 1990 para 26% em 2008. A distribuição desigual da renda diminuiu. A hiperinflação é um pesadelo que ninguém se lembra. A dívida externa está em 4% do PIB - invejável. As exportações aumentaram cinco vezes em apenas vinte anos. E por último, mas não menos importante, na próxima década, o Brasil poderá se tornar uma potência de petróleo.

Devido ao seu sucesso e tamanho, o Brasil é agora uma presença indispensável nas negociações internacionais sobre clima, energia, comércio, finanças, desenvolvimento, proliferação nuclear e outros desafios que o mundo enfrenta. Assim, Lula tornou obsoleta a piada de mau gosto, segundo a qual o Brasil foi o país do futuro e assim continuará a ser para sempre. O Brasil já alcançou muito do seu potencial e não há dúvida de que Lula merece um crédito enorme por essas conquistas.

- O mau. Lula é pouco generoso. Deveria compartilhar o crédito pelas conquistas do país com Fernando Henrique Cardoso, seu antecessor no cargo. Lula herdou uma economia reformada, políticas sociais de vanguarda e uma base muito sólida para aprofundar a liberalização e a desregulamentação econômicas que explicam o sucesso atual do Brasil. O grande mérito de Lula é ter mantido, ampliado e defendido estas políticas, que contrastam com as posições ideológicas que ocupou durante anos. Lula liderou a oposição às reformas que hoje lhe concedem aplausos pelo mundo afora.

Enquanto que nas reuniões de cúpula revolucionária com Chávez, Castro e Ortegas, Lula compartilha com entusiasmo as loas ao socialismo, já nas suas decisões no Brasil são notáveis por sua ausência. Lula tem sido um dos presidentes mais pró-mercado, pró-setor privado e do investimento estrangeiro que o Brasil já teve. Ele disse muitas vezes que as políticas econômicas de mercado são usadas para construir as bases para o socialismo. Poucos acreditam nele. E é fácil de supor que um dos que não acreditam nele é o próprio Lula.

Infelizmente, o presidente brasileiro tem sido incapaz de impedir que, no seu círculo mais próximo, floresça a corrupção que permeia os governos da América Latina. Dizer que esta é a uma coisa habitual é tão justo quanto reconhecer que a luta contra a corrupção nunca foi uma prioridade para Lula.

- O feio. Lula da Silva tem sido muito bom para os brasileiros e muito mau para milhões de seus vizinhos. Os déspotas que têm a sorte de ser amigo do presidente brasileiro, e que estão arruinando seus países, enquanto o Brasil avança, sabem que contam tanto com o estridente apoio como com a cumplicidade silenciosa de Lula. Seu incondicional respaldo público dá-lhes legitimidade internacional que lhes permite agir com maior impunidade, mesmo em seus países. Seria ingênuo esperar que Lula seja o gendarme da democracia e dos direitos humanos na região. Mas, não deve ser ingênuo esperar que aqueles que violam repetidamente os direitos fundamentais dos seus povos sabem que não têm o tolerante silêncio de Lula e o seu fraterno abraço nas reuniões presidenciais. Não seria maravilhoso se aqueles que estão presos por lutar pela democracia em outros países soubessem que Lula é seu aliado, e não de seus carcereiros?

A lista de contradições, incoerências e exemplos de dois pesos e duas medidas de Lula é triste e grande. E não passa uma semana sem crescer. A mais recente foi ao obrigar o novo presidente de Honduras, Porfirio Lobo, a ser excluído da cúpula presidencial da União Europeia e América Latina. De acordo com o Brasil, Lobo, que ganhou as eleições sem fraudar - o que é comum na região de Hugo Chávez e Daniel Ortega - não tem legitimidade democrática suficiente para estar na reunião. Este é o mesmo presidente que disse ao mundo que o presidente do Irã, Mahmud Ahmadinejad, ganhou as eleições em seu país limpamente e que os milhares de iranianos que protestaram nas ruas estavam agindo como torcedores desordeiros de uma equipe de futebol após uma derrota. Enquanto Lula dizia isso, Ahmadinejad condenava à pena de morte alguns dos manifestantes. Feio, não?

Por tudo isto, Lula entrará para a história como um grande presidente para o seu povo e um vizinho muito mau para os amantes da liberdade.

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