7.4.07

Queria que o sinal fechasse


Noite de quinta-feira, quase 9h, tinha ficado cerca de 45 minutos esperando o busão. Aquele era um dos dias em que tudo que eu mais queria era estar em casa, na minha cama. A neblina do noite passada e o copo gelado de refri tinha feito um efeito terrível, eu estava muito mal. Dor no corpo, dor de cabeça e aquela sensação de que a gripe tava chegando sem bater a porta.

Depois de um dia todo lutando contra os males físicos e tentando cumprir com as minhas obrigações, a volta pra casa parecia que nunca ia terminar. Durante a manhã cizenta encarei algumas aulas, mesmo não se concentrando no que dizia o professor de Semiótica. À tarde, no trabalho, não queria que ninguém me dirigisse a palavra, mas... fazer o quê? Tento ser o gentil de sempre.

As curvas feitas pelo ônibus faziam minha cabeça girar, minhas pálpebras caiam sem que eu percebesse, a cada parada a luz da gabine do motorista acendia e fazia doer os meus olhos. Os freios eram os inimigos do meu corpo solto sobre a cadeira. Eu nunca havia feito uma viagem daquela, logo que me sentei e já queria descer, o que só seria possível depois de um tempão. Tinha que atravessar toda a cidade até chegar no ponto mais próximo de casa.

Voltas e voltas, minha expressão cansada e abatida revelava até à aqueles que não me conhecem que eu não estava bem.
- Você está precisando de ajuda? Perguntou o cobrador quando eu passei pela catraca, borboleta para alguns.
Disse que não e fui me sentar, afinal o que ele poderia fazer por mim? Teria que esperar da mesma maneira até chegar em casa. Outra coisa me fazia mais triste, fome. Já fazia um tempo que algo havia cobrido o meu estômago, mas ele já nem reclamava, pelas condições que meu corpo estava, o que ía adiantar?

Algumas ruas e avenidas depois, me vejo parado no sinal. À frente do ônibus, um carro de passeio e ao lado, numa calçada, estavam dois malabaristas. Um homem e uma mulher com as caras pintadas faziam garça para o carro da frente. A mulher, uma jovem mulher, com cara de menina sapeca estava com os pés descalços e com um macacão preto.

Percebi que ela me encarava, mas me encarava fazendo uma cara feia. Como quem imita alguém irritado. Aí que eu percebi que esse alguém era eu mesmo. Ela inisistiu, mexia os olhos como quem diz "dê um sorriso pra mim". Meus olhos a pouco não estavam respondendo a nenhum estímulo exterior, eu não estava fixando o olhar e muito menos refetindo sobre nada. Mas, a jovem mulher com o nariz pintado me prendeu a atenção por alguns segundos e posteriormente foi a responsável por um largo sorriso meu, um sorriso gostoso, desses que a gente dá quando vê alguém que a gente ama muito chegar.

Ela vibrou, pulou feito criança presenteada com o melhor brinquedo, deu cambalhota e sorriu pra mim como quem diz "obrigada". Verde, o ônibus, e eu dentro dele, seguiu o seu caminho. Meu caminho não diminuíra, mas a viagem havia se tornado um pouco mais leve. Os segundos que duraram o meu sorriso serviram o suficiente para eu esquecer o que me tornava a pessoa mais triste do mundo naquela noite.

Comecei a pensar sobre o significado daquilo, pra mim e pra moça. Talvez aquela seja a missão dela, espalhar alegria, fazer uma pessoa sorrir... sei lá. Ou talvez aquilo aconteceu para que eu percebesse que, mesmo em momentos de pouca ou muita dor, a vida continua acontecendo e há sempre motivos para sorrir. Isso faz parte da minha vida, sorrir é comigo mesmo, quem me conhece sabe que me fazer sorrir não é nenhuma dificuldade, meu cumprimento é um sorriso. Mas naquela noite meu sorriso teve um significado muito diferente, valeu por muitos outros sorrisos sem motivos. Valeu tanto que no outro dia, de dento do ônibus, eu torcia para que o sinal fechasse e eu ficasse novamente frente a frente com a moça do nariz pintado.

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