8.3.08

Cuba, Fidel e a mídia


A renúncia de Fidel foi pauta na mídia brasileira. Aliás, desde quando se afastou, Fidel e o seu estado de saúde aparecem nos jornais daqui. Só que passou de uma curiosa preocupação para a especulação exacerbada. Chegam a questionar qual o futuro de Cuba. Não sei se os caros leitores já notaram de onde “brotam” essas notícias que chegam aqui à respeito da ilha. Na Rede Globo, pelo menos, é o correspondente dos EUA que nos passa as últimas informações sobre Fidel e sobre Cuba. Podem reparar.

A mensagem publicada por Fidel no dia 19 de fevereiro foi destaque, perdão. Corrigindo: PARTE da mensagem publicada por Fidel no dia 19 de fevereiro foi destaque. Reduziram a carta em: FIDEL ANUNCIA RENÚNCIA. Na verdade o comunicado do líder cubano dizia “não aspirarei nem aceitarei o cargo de Presidente do Conselho de Estado e Comandante-em-chefe”. Mais assustador é o que os nossos criteriosos repórteres e editores fazem. A análise já não existe, as informações são superficiais e a parcialidade obedece à linha das agências de notícias norte-americanas que abastecem o jornalismo daqui.

Já se referiram a Cuba como um país órfão; já projetaram as possíveis mudanças com a sonhada (pela mídia) intervenção dos EUA; já decretaram o fim do socialismo cubano e da revolução. Aliás, Cuba é um país morto e enterrado há muito tempo, não é mesmo? Pelo menos é isso que as TV’s e os jornais dizem (‘grandes merda!’).

Para não cair no mesmo erro, vou me ater a idéias de quem realmente conhece, conviveu e estudou a realidade cubana. O sociólogo e autor do livro Cuba: um socialismo em construção, Emir Sader, disse em recente entrevista que em Cuba, para a tristeza da mídia especulativa, pouco mudará na prática após a renúncia. E ainda fez uma importante observação que poucos ditos analistas políticos fazem. “Fidel Castro já não é o dirigente político da revolução, a transição foi feita no marco da sociedade socialista, com Fidel ou sem Fidel, Cuba vai seguir, e a revolução segue em uma nova etapa em seu processo de transformação socialista”.

Dentro da mesma idéia, o historiador cubano e morador de Havana, Ariel Dacal escreveu: “para pessoas iludidas, que reduzem o sistema cubano à figura de Fidel, a renúncia pode ser significativa. Mas não entendem que a rede institucional cubana e as demandas atuais são muito mais complexas do que essa suposta subordinação total à Fidel”. Permita-me o comentário, ignorante quem ainda diz coisas do tipo “a ilha de Fidel”, “o que será de Cuba sem Fidel?”... Afinal, foram quase 50 anos no poder, pode até parecer clichê, mas o que foi construído em 50 anos não se desfaz da noite pro dia. A estrutura política de Cuba é sólida o suficiente pra resistir e continuar. Fidel nunca esteve sozinho a frente do poder, quem conhece a história de Cuba e como se deu a revolução, sabe que o apoio popular que a fez vitoriosa durante todo esse tempo.

O escritor Ignácio Ramonet atesta que os cubanos não desejam mudanças: “eles não querem perder as vantagens que foram conquistadas, a educação gratuita até a universidade, o acesso gratuito e universal à saúde, ou o fato de que há segurança e paz, num país onde a vida é calma. E estão, há um ano e meio, se acostumando com a idéia, enquanto Fidel permaneceu teoricamente como presidente”. No texto de Dacal, ele também confirma: “o impacto entre os cubanos foi somente emotivo, em Cuba não se discute o retorno ao capitalismo”. A jornalista cubana Tamara Roselló conta que “nas ruas, as pessoas estão tranqüilas”. O jornalista Jorge Garrido acrescenta que “não há barulho nem comoção em Havana. Ninguém grita, tampouco ninguém chora e nem soam as buzinas dos carros”. A indiferença do povo mostra que Cuba continuará a mesma, para a infelicidade do imperialismo ianque, como diz Fidel.

No dia 24 de fevereiro a Assembléia Nacional do Poder Popular de Cuba designou Raúl Castro como novo presidente do Conselho de Estado, cargo que ocupara desde o afastamento do irmão. Em seu discurso, Raúl disse que o comandante e chefe da revolução é um só, “Fidel é Fidel, é insubstituível”. Adiante, o novo presidente pediu permissão à Assembléia para continuar consultando Fidel em todas as decisões importantes para o país, a proposta foi aplaudida e aprovada por todos os 614 deputados.

Fidel já havia se disponibilizado ao papel proposto pelo irmão, na mesma mensagem de 19 de fevereiro ele afirmou que continuaria escrevendo. “Não me despeço de vocês. Desejo apenas lutar como um soldado das idéias. Continuarei a escrever sob o título 'Reflexões do companheiro Fidel'. Será mais uma arma do arsenal com o qual se poderá contar. Talvez ouçam minha voz. Serei cuidadoso”.
P.S. da Coluna Tô, ultimamente tenho me dedicado a estudar sobre Cuba

Um comentário:

Anônimo disse...

Além disso, Fidel não entregaria a qualquer pessoa o cargo mais importante do país. Certo de que, só faria isso tendo absoluta certeza de que seu sucessor manteria tudo que demorara tanto tempo para construir.